Artigo: Os Efeitos Fisiológicos da Crioterapia na Inflamação Aguda - Uma Revisão.





Atualmente um dos fatores que pode explicar a alta taxa de incidências de lesões musculares é a preocupação com a forma física, a qual vem recrutando cada vez mais adeptos às atividades esportivas, muitas vezes sem qualquer orientação.

Sendo a crioterapia largamente utilizada no tratamento de diversas patologias, dentre elas a lesão muscular, verifica-se a necessidade de observar os eventos da crioterapia na reparação tecidual.

O músculo possui grande habilidade em recuperar-se diante de tal lesão, que pode ser precedida de fatores etiológicos como altas temperaturas, agentes miotáxicos, trauma direto, doenças musculares, inflamações, isquemias e alongamentos excessivos. Entretanto em cada caso ocorre necrose de algumas ou de todas as fibras musculares envolvendo poucos ou todos os sarcômeros [ 7 ]

As lesões musculares podem ocorrer por mecanismos diretos ou indiretos, sendo que as lesões indiretas acontecem por problemas neurológicos (lesão de neurônio motor) ou vasculares (isquemia) atingindo o tecido muscular, e as lesões diretas podem ser causadas basicamente por sobrecarga repetitiva ou por traumatismo local direto, tendo como conseqüência a inflamação no local da lesão [ 11 ].

Segundo Robbins [ 12 ], a inflamação refere-se a reação do tecido vivo vascularizado a uma lesão local. São causadas por infecções microbianas, agentes físicos, substâncias químicas, tecidos necróticos e reações imunológicas. O papel da inflamação consiste em conter e isolar a lesão, destruir os organismos invasores, inativar as toxinas e iniciar os processo de cura e reparo. Todavia, a inflamação e o reparo podem ser potencialmente nocivos, causando reações de hipersensibilidade que ameaçam a vida do indivíduo, bem como lesão progressiva e fibrose dos órgãos [ 9 ].

A inflamação caracteriza-se por: (1) vasodilatação dos vasos sanguíneos com conseqüente aumento do fluxo sanguíneo no local, (2) aumento da permeabilidade dos capilares com extravasamento de líquidos para os espaços intersticiais, (3) muitas vezes coagulação do líquido nos espaços intersticiais devido às quantidades excessivas de fibrinogênio e de outras proteínas que extravasam dos capilares, (4) migração de granulócitos e monócitos para o tecido, (5) edema tecidual. A intensidade do processo inflamatório é comumente proporcional ao grau de lesão tecidual [ 9 ]

De acordo com Rodrigues [ 14 ], a inflamação pode ser dividida em aguda ou crônica, dependendo da duração, tendo a inflamação aguda uma duração desde poucos minutos até poucos dias, e a crônica a duração de semanas ou meses. Com isto, a quantidade total de tecido danificado pode aumentar, e como o principal objetivo na fase inflamatória aguda é minimizar a hemorragia e tumefação, o uso de um agente crioterápico é justificado.

Os estágios iniciais da inflamação são caracterizados por mudanças vasculares. Imediatamente após a lesão, ocorre uma vasoconstrição local, que dura de 5 a 10 minutos. A vasoconstrição é seguida por vasodilatação ativa de todos os vasos locais pequenos e por fluxo sanguíneo aumentado [ 1 ].

Este fenômeno possibilita o processo de diapedese dos neutrófilos para os espaços teciduais, porém junto com essa vasodilatação para a diapedese extravasa mais líquido, o que caracteriza o aumento do edema [ 9 ].

A ação do frio durante o tratamento imediato nas lesões agudas reduz o tempo de reabilitação e promove um retorno mais rápido ás atividades físicas. Estes efeitos são denominados pelas seguintes variáveis: redução da inflamação; redução da hipóxia secundária; diminuição do edema e hematoma; reduzir o limiar de transmissão nervosa da dor e redução do metabolismo podendo dar início ao processo de reparação mais rapidamente e com um menor tempo para a reabilitação [ 2 , 6, 14 ].

A técnica recomenda aplicação do frio durante 20 a 30 min., com intervalo de 2 horas, nos tecidos moles lesados. A aplicação deve ser realizada durante as primeiras 24 a 48 horas após a lesão, para minimizar o edema e o espasmo muscular e dor [ 15 ].

Desta maneira recomenda-se o uso precoce da crioterapia, favorecendo os processos de reparação [ 14 ].

Discussão

Os efeitos fisiológicos citados pela literatura são conflitantes em alguns pontos, principalmente relacionados a inflamação e à circulação. Contudo, consegue-se definir algumas categorias consideradas como as mais importantes que são: efeitos metabólicos, circulatórios, neurológicos e a redução da dor e do espasmo muscular [ 14 ].

Porém, algumas idéias são conflitantes em relação à duração da terapia, de acordo com Guirro et al [ 10 ], o efeito da crioterapia atua nas primeiras doze a vinte e quatro horas após a lesão. No entanto, a crioterapia exerce seus efeitos benéficos quando aplicada em até 48 horas após a lesão, segundo [ 15 , 17 ]

Em relação ao tempo de aplicação as idéias também divergem. Segundo Lianza [ 11 ] a vasoconstrição ocorre entre 1 a 12 minutos de aplicação e a vasodilatação profunda reflexa ocorre de 12 a 15 minutos de aplicação. Porém KNIGHT, [ 17 ] afirma que não correto a aplicação do gelo por somente 20 minutos em caso de lesão aguda, pois este tempo não é suficiente para que ocorra a diminuição do fluxo sanguíneo da hemorragia e da hipóxia secundária.

Um outro ponto em que há grande divergência de opiniões é em relação a vasodilatação reflexa, que significa vasi\odilatação em resposta a aplicação do frio. Muitos acreditam, que é o aumento do fluxo sanguíneo durante ou após as aplicações de frio, e que este aumento é considerado superior ao repouso.

Porém se considerarmos um vaso sanguíneo que tenha recebido aplicação de crioterapia, e se contraiu para 20% de seu tamanho usual, e depois se dilata para 25% de seu tamanho usual; mesmo assim o fluxo sanguíneo através dele é de 25% da quantidade normal, e não significa que está transportando mais sangue. [ 16 ].

Guirro et al [ 10 ]; Cortez & Signori [ 5 ] afirmam que a analgesia inicia-se por volta das primeiros cinco minutos de aplicação, pois é neste período que ocorre a maior variação de temperatura, devido a rápida diminuição do fluxo sanguineo local devido a vaso constrição, no entanto, Rosa et al [ 13 ] descrevem que o efeito analgésico começa a se instalar em torno de 15 minutos.

Em relação as células inflamatórias de tecidos lesados, sem aplicação da crioterapia, sabe-se que os neutrófilos constituem a primeira ordem de migração permanecendo dominante e atuando nas primeiras 24 a 48 horas após a lesão FREIRE, [ 7 ].

Entretanto para Amabis & Martho [ 2 ], as primeiras células a entrar em ação na resposta imunitária são os macrófagos que fagocitam células e outros materiais estranhos ao corpo. FAULKNER [ 7 ] e BODINE-FOWLER [ 6 ] determinam que na regeneração do tecido muscular esquelético, logo que a lesão tecidual ocorrerá degeneração intrínseca, proliferação de células satélites e invasão de macrófagos e neutrófilos, sendo este segundo em maior quantidade entre 12 e 24 horas.

Os efeitos histológicos citados na literatura correlacionam-se entre si, entretanto não estão elucidado os efeitos da crioterapia sobre as células inflamatórias, e no processo de regeneração tecidual.

Conclusão

De acordo com KNIGHT [ 17 ], as bases fisiológicas da crioterapia não são tão bem compreendidas como suas respostas clínicas. As tentativas de explicar os sucessos clínicos da aplicação de frio levaram a explicações simplistas demais que, às vezes, não se mantém sob exame mais minucioso.

Muitos dados são conflitantes em relação ao templo de aplicação, freqüência e efeitos, também há escassez de dados histológicos frente à aplicação do frio, neste contexto, há necessidade de se obter dados concretos sobre o possível efeito da crioterapia, principalmente pelos achados não fidedignos em amostras experimentais.

Referências Bibliográficas

 

1. Alter, M. J. Ciência da Flexibilidade. 2 ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 1999.

2. Amabis, J. M.; Martho, G. R. Defesas do Corpo: O Sistema Imunitário. Temas de Biologia-Atualidades Biológicas. n. 10, p. 1-7, out. 1998.

3. Basford, J. R. Terapeutica B. Modalidades Físicas. Porto Alegre: Artes Médicas; 2000.

4. Bodine-Fowler, S. Skeletal muscle regeneration after injury: overview. Journal of voice. n. 1, v. 8, p. 53-62, may, 1994.

5. Cortex, A. N. & Signori, L. U. Estudo do risco da necrose cutânea induzida pela crioterapia na forma de aplicação de gelo direto à pele de cobaias. Praxisterapia-Revista de Fisioterapia da Universidade de Cruz Alta. n. 3, v. II, p. 16-23, dez.2000.

6. Cailliet, R. Dor: Mecanismos e Tratamento. Porto Alegre: Artmed; 1999.

7. Faulkner, J. A. Injury to skeletal muscle fibers during contractions: conditions of occurency and preventions. Physical Therapy, n. 12, v.73, p. 911-20, 1993.

8. Freire, E. Trauma-A doença do Século. v. 1. São Paulo: Atheneu, 2001.

9. Gayton, A. C.; Hall, J. E. Tratado de Fisiologia Médica. 9 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997.

10. Guirro, R.; ABB, C.; Máximo, C. Os efeitos fisiológicos da crioterapia: Uma revisão. Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. n. 2, v. 6, p. 164-70, jul/dez, 1999.

11. Lianza, S. Medicina de Reabilitação. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1995 12. Robbins, S. L. et al.Patologia Estrutural e Funcional. X ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1999.

13. Rosa, G.; Nunes, C.; Oliveira, J. Efeitos Fisiológicos da Crioterapia na Inflamação Aguda Causado por Traumatismo Fechado-Uma revisão. Reabilitar. n. 14, 2002.

14. .Rodrigues, A. Crioterapia: Fisiologia e Técnicas Terapêuticas. São Paulo: Cefespar; 1995. 15. Tepperman, P. S. & Devlin, M. Therapeutic Heat and Cold: A practitioner's guide. Postgraduated medicine. n. 1, v. 73, p. 69-76, jan. 1983.

16. Knight, K. L. Crioterapia no Tratamento das Lesões Esportivas. São Paulo: Manole; 2000.

17. Kisner, C. & Colby, L. A. Exercícios Terapeuticos Fundamentos e Técnicas. 3 ed. São Paulo: Manole; 1998.

Artigo Publicado em: 07/01/2004
Autor(es):
Karla Denyse de A Evaristo e Renato Claudino

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